Cotidiano

‘Dá para ver a tristeza e a saudade no olhar’, diz tio sobre menina de 4 anos que viu mãe ser morta pelo pai em Reserva

A história de uma menina, de quatro anos, foi completamente alterada no ano passado quando viu a mãe ser morta a tiros pelo próprio pai. Ela estava no local quando o crime aconteceu, na Baixa Funda, área rural do município de Reserva, inclusive noticiado pelo Portal Reserva News. (Leia a noticia clicando no link abaixo)

Segundo o tio da criança, A.F * , desde que presenciou o assassinato da mãe, a menina tem tido comportamentos mais “revoltados”, se assusta durante a noite e relembra com frequência do que viu.

A mãe, Adriane Speke, foi morta em 6 de dezembro do ano passado, aos 28 anos. De acordo com a Polícia Militar, o ex-marido dela invadiu a casa e atirou contra a jovem e contra o pai  de Adriane, Pedro Speke, de 68 anos, que também morreu.

Após o crime, o autor dos disparos também tirou a própria vida. O irmão a mulher morta conta que, desde o assassinato da mãe, a sobrinha parou de se referir ao homem como pai.

Traumas da violência

De acordo com a psicóloga e professora da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR) Maria Cristina Neiva de Carvalho, reações como a da menina são normais após um trauma e os danos da violência presenciada “ficam para a vida toda”.

Ainda conforme a psicóloga, as manifestações da dor podem aparecer de diferentes formas em cada criança e variar de acordo com a idade.

Elas podem desenvolver problemas físicos, em especial na primeira infância, além de mudanças comportamentais.

“As consequências psicológicas podem desenvolver imediatamente todos os sintomas do estresse pós-traumático. A criança pode generalizar a falta de confiança para todas as pessoas e ter dificuldade de fazer amizade. Pode ficar introspectiva, tímida, ou fazer o oposto também. Pode acabar desenvolvendo uma reação ao mundo com toda aquela violência que ela recebeu. Como se fosse devolver”, explicou.

No caso da menina de Reserva , as sessões com a psicóloga começaram no começo deste mês. Uma vez por semana, a criança vai à terapia.

Ela retornou para a escola e, segundo o tio, tem uma boa relação com outras crianças.

Mudança na rotina

A.F.* também estava no dia do crime e chegou a levar um tiro. Recuperado, ele agora ajuda a mãe a cuidar das crianças da irmã.

Segundo ele, a rotina de toda a família mudou depois do crime. Ele deixou o emprego e a casa que tinha em Ponta Grossa, na mesma região, e voltou para Reserva para ficar com a família.

Além da menina de quatro anos, a mãe morta pelo ex-companheiro também tinha uma filha ainda bebê, de sete meses.

A família tenta encontrar formas de dar apoio, amor e acolhimento às sobrinhas, que ficaram órfãs. A.F.* contou que a saudade e as lembranças aparecem no dia a dia, em atitudes.

Sobre a bebê, A. F. contou que o primeiro mês foi o mais difícil. Segundo ele, ela chorava constantemente mesmo quando acolhida por outras pessoas da família, mas que , agora, está bem e “tranquila”.

Impactos para a criança
A psicóloga Maria Cristina Neiva de Carvalho explica que o feminicídio, especialmente quando praticado dentro de casa, fere um dos principais pontos para o desenvolvimento de uma criança: a família.

“A família para qualquer criança é a matriz de identidade, onde a gente desenvolve a noção de quem somos, de socialização, onde a gente aprende o que pode e o que não pode, de vínculo, onde a gente aprende como eles se estabelecem e de pertencimento, de proteção. Todas essas matrizes ficam muito abaladas. A criança pode se sentir sem valor, que ninguém pensou nela”, afirma.

Maria Cristina também citou a questão da violência transgeracional, isto é, a replicação do comportamento de uma geração para a outra. Segundo ela, ao ver o comportamento violento, a criança pode assimilar o padrão como o correto e, no futuro, repetir dentro de uma relação.

“Toda criança no ambiente familiar tem nas relações pessoais, dentro de casa, os modelos de como a gente enfrenta as situações, como a gente resolve conflitos, como a gente supera dificuldades. Quando ela vê um feminicídio, ela pode aprender e internalizar que essa é a uma forma de resolver as coisas”.

Além disso, a violência transgeracional também pode se evidenciar na normalização da violência, em especial por parte de mulheres. Ao verem isso acontecer dentro de casa, elas podem vir a se submeter ao mesmo ciclo no futuro.

Por isso, segundo a psicóloga, é fundamental que qualquer pessoa envolvida em um processo de violência contra a mulher, em especial a criança, tenha acompanhamento psicológico para que possa seguir a vida.

“Ela nunca vai deixar de lembrar, provavelmente, a menos que faça bloqueio – o que também não é bom-, mas ela vai ter formas de conviver com o que aconteceu de um jeito mais saudável para ela própria, para a vida”, enfatizou.

Feminicídio no Paraná

Desde 2015 o Código Penal prevê o feminicídio como qualificador do crime de homicídio. A lei considera que o crime se deu por razões ligadas à “condição do sexo feminino” quando, por exemplo, envolve violência doméstica e familiar; menosprezo ou discriminação à condição de mulher.

No Paraná, entre janeiro e setembro de 2021, 49 mulheres morreram vítimas de feminicídio, de acordo com dados da Secretaria de Estado de Segurança Pública (Sesp). Durante todo o ano de 2020, 73 mulheres foram mortas pelo fato de serem mulheres.

*Para preservar a identidade da criança, a reportagem utiliza iniciais fictícias para se referir às pessoas ouvidas.

Fonte – Com a colaboração do Portal G1

Redação Reserva News

Matéria que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente por nossa equipe de jornalismo ou obtidos pelos acessos a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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