Transtorno do Espectro Autista – TEA

1077 2

Durante o último ano da faculdade de Psicologia, o desenvolvimento do TCC, “Trabalho de Conclusão de Curso”, é requisito obrigatório. O tema a ser escolhido é livre, de acordo com o interesse do universitário, mas que apresente relevância para a sociedade, ou seja, que tenha uma importância para as pessoas.

Como pedagoga e professora, trabalhei em escola especial (fiz especialização nesta área), tendo sempre contato com várias deficiências, incluindo o Autismo. Desta forma, a escolha para o meu TCC não poderia ser outro, do que um tema que abordasse este assunto tão importante e de conhecimento necessário para todos.

E assim nasceu o TCC que recebeu como título “Aspectos Psicológicos da Dinâmica Familiar de Crianças com Transtorno do Espectro Autista – TEA”. Este assunto traz à tona a grande preocupação que sempre tive, sobre como a família se sente impactada com a chegada de um autista, desde o seu diagnóstico, seus direitos, os desejos para com a nova realidade, as adaptações necessárias na rotina, a busca por uma rede de apoio e como será o processo de crescimento da pessoa com este diagnóstico.

Trago aqui, informações importantes que fui coletando e atualizando, com o objetivo de levar ao conhecimento da comunidade como um todo, sobre este assunto extremamente importante e que a cada dia mais entramos em contato.

O Dia Mundial da Conscientização do Autismo – 02 de abril – foi estabelecido em 2.007 pela Organização das Nações Unidas (ONU). Esta data tem como objetivo principal divulgar informações e esclarecer dúvidas sobre o TEA. Desta forma, busca-se tornar conhecida esta condição que se tem tornado cada vez mais presente em nossas vidas, visando também reduzir a discriminação e o preconceito que cercam as pessoas que são autistas.

A cor azul foi adotada, porque o maior número de crianças diagnosticadas são meninos. As meninas, por serem dotadas de algumas habilidades diferenciadas, apresentam certa “proteção”, ou seja, mascaram o autismo, pois são mais sociáveis e muitas vezes conseguem disfarçar os sintomas.

Os sinais que caracterizam o TEA possuem expressividade variável e geralmente iniciam-se antes dos três anos de idade. Ele está presente desde o nascimento. Porém, os primeiros sintomas são identificados entre os 12 e os 24 meses, na maioria das vezes pelos próprios cuidadores, sendo as dificuldades no desenvolvimento sociocomunicativo os mais frequentemente reportados

– O QUE É O TEA?
O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é um dos transtornos invasivos mais conhecidos, relacionado ao neurodesenvolvimento – causa déficits em 3 áreas importantes – sendo caracterizado por sinais e sintomas que compreendem dificuldades na comunicação (comunicação verbal e não verbal), no comportamento (interesses ou movimentos repetidos) e na interação social. Acarreta, também, implicações no modo de sentir os estímulos e reagir a eles, afetando sobremaneira o convívio familiar.

O termo “Autismo” (do grego autós, significa “de si mesmo”) foi descrito pelo psiquiatra suíço Eugen Bleuler, em 1911, de forma a caracterizar a evasão do que é factual, para um mundo único, interior, o mesmo que percebido em pacientes esquizofrênicos. O termo diz respeito a uma pessoa que se fecha em si mesmo, evitando quaisquer tipos de relacionamento com o meio que a cerca, inclusive chegando às características de mudez.

– O QUE COMPROMETE?
Há prejuízos em três áreas do desenvolvimento humano:
– Habilidades socioemocionais
– Atenção compartilhada
– Linguagem

– POR QUE ESPECTRO?
O espectro engloba um conjunto de variações dentro de uma mesma condição, com diferentes níveis de intensidade, segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-V)

A palavra “Espectro” é utilizada para esclarecer que não existe apenas uma condição única, mas sim condições compostas por vários subgrupos, cada um sendo diferente entre si, assim como são os autistas, com as suas características. É importante reforçar que todo autista tem sua individualidade. Alguns aspectos podem se assemelhar num grupo, porém cada um tem suas particularidades.

– ALGUMAS EVIDÊNCIAS QUE PODEM SER INDÍCIO DE AUTISMO
– Demora ou incapacidade para desenvolver a fala;
– Movimentos repetitivos;
– Alteração nas funções motoras;
– Apego a determinados objetos;
– Preferência por determinadas comidas;
– Dificuldade de manter contato visual;
– Dificuldade de concentração;
– Problemas de autonomia;
– Pouca empatia;
– Dificuldades de socialização;
– Dificuldade em expressar suas necessidades;
– Sensibilidade a cheiros, sons, luzes, texturas e toque.

– COMO SÃO OS AUTISTAS?
Cada um é único, sendo então, diferentes entre si. Por isso, uma terapia, o modo de agir com um autista, pode não dar certo com outro. Os autistas são diferentes entre si e podem ser/apresentar dentro de seu quadro:
– Doenças e condições associadas como déficit intelectual ou epilepsia (comorbidades, ou seja, doenças que passam a coexistir),
– Independentes, com vida comum,
– Sequer saber que são autistas, pois jamais tiveram diagnóstico.
– Podem também apresentar habilidades impressionantes como aprender visualmente, extrema atenção aos detalhes e exatidão, memória acima da média, concentração, habilidade para línguas e instrumentos musicais.

Uma referência sobre como um autista pode se desenvolver dentro de suas potencialidades quando bem estimulado, é a americana Mary Temple Grandin (Boston, 29 de agosto de 1947). Ela tem autismo de alto funcionamento e formou-se psicóloga e zootecnista. Na juventude criou a “máquina do abraço”, uma engenhoca para lhe pressionar como se estivesse sendo abraçada e que a acalmava, pois não aceitava toque de outras pessoas, assim como muitos autistas.

O termo “Alexitimia” é empregado no diagnóstico clínico de pessoas com acentuada dificuldade ou incapacidade para expressar emoções e significa “sem palavras para as emoções”. O autista muitas vezes tem dificuldade para exprimir sentimentos como dor, tristeza, alegria, raiva, medo, nojo. Essa dificuldade de se fazer entender pode desencadear comportamentos violentos, agressivos, depressivos, pois não consegue demonstrar o que está sentindo.

O autista pode responder de maneira intensa aos estímulos que estão ao seu redor, como por exemplo, uma etiqueta numa roupa. Para os não autistas, a etiqueta não faz diferença. Para um autista, ela pode ser extremamente incômoda, fazendo-o até mesmo, querer ficar sem roupa. Outra situação são sons altos ou diferentes aos quais ele está habituado, causando-lhe um grande desconforto ao ouvi-los.

Quando se fala sobre os direitos do Autista, a primeira ideia que se deve ter em mente, é elaborar em conjunto com diversos setores, também família e profissionais, um projeto envolvendo políticas públicas que tratem de suas demandas. Ou seja, todas as esferas da sociedade precisam juntas conversar sobre essa temática, para chegar a um consenso sobre o que pode ser feito em cada área. Autista que tem seus direitos respeitados, apresenta uma qualidade de vida adequada e como consequência, aprende mais e desenvolve-se melhor.

Em 2015 a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (13.145/15) cria o Estatuto da Pessoa com Deficiência, que aumenta a proteção às pessoas com TEA, ao definir a pessoa com deficiência como “aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial”. O Estatuto é um símbolo importante na defesa da igualdade de direitos dos deficientes, do combate à discriminação e da regulamentação da acessibilidade e do atendimento prioritário.

Em 2020, a Lei 13.977, Lei Romeo Mion, cria a Carteira de Identificação da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (CIPTEA). O texto altera a Lei Berenice Piana (12.764, 2012), que institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista. De acordo com a nova lei, a Carteira deve assegurar aos autistas atenção integral, pronto atendimento e prioridade no atendimento e no acesso aos serviços públicos e privados, em especial nas áreas de saúde, educação e assistência social.

– FATORES DE RISCO
Os fatores de risco são as condições que corroboram para uma situação em que haja possibilidade de nascer uma criança com TEA. Eles podem ser:
– Multifatoriais, ou seja, resultantes de uma interação entre fatores genéticos e ambientais.
– Fatores ambientais: exposição a poluentes atmosféricos, metais pesados, material particulado (MP).
– Fatores genéticos: a pesquisa científica sempre concentrou esforços no estudo da predisposição genética, analisando mutações espontâneas que podem ocorrer no desenvolvimento do feto e a herança genética passada de pais para filhos. No entanto, já há evidências de que as causas hereditárias explicariam apenas metade do risco de desenvolver TEA.
– Poda neuronal: ocorre por volta dos 24 meses e é algo que acontece a todas as pessoas. Mas no caso dos autistas, pode acontecer um excesso nesta poda, o que acarreta uma regressão, podendo ser também responsável pelo autismo.

Nos últimos anos, o papel das mudanças ambientais, durante os períodos pré-, peri- e pós-natal, foi seriamente considerado na literatura. Estresse, infecções, exposição a substâncias tóxicas, complicações durante a gravidez, nascimento prematuro e desequilíbrios metabólicos também devem ser considerados.

– OCORRÊNCIA:
De acordo com o mais recente relatório divulgado pelo CDC (Centers for Disease Control and Prevention), a prevalência do TEA é de 1 diagnóstico em cada 36 crianças nos Estados Unidos. Esta pesquisa foi realizada pela rede de monitoramento de deficiências de desenvolvimento e autismo e desenvolvida em nos Estados Unidos, em 11 diferentes estados, com base na análise de registros de serviços médicos e educacionais das comunidades, contando com mais de 220 mil crianças avaliadas.

A prevalência geral de TEA anotada foi de 27,6 por 1.000 ou seja, 1 em 36 crianças até os 8 anos de idade (aproximadamente 4% dos meninos e 1% das meninas). Isto significa que o aumento contínuo de crianças autistas mostra a necessidade de infraestrutura aprimorada para fornecer diagnóstico, tratamento e serviços de apoio equitativos.

Fonte – Centers for Disease Control and Prevention.

– EQUIPE TRANSDISCIPLINAR
Para que um autista possa se desenvolver com toda sua potencialidade, é importante que os profissionais que o atendem mantenham contato entre si, buscando a melhor forma de proporcionar o seu desenvolvimento. Ter escolas capacitadas com professores tutores, a realização de terapias como Psicologia, Terapia Ocupacional, Fonoaudiologia, Fisioterapia, Medicina especializada, Nutricionista, a realização de prática esportiva, musicalização, pintura, trazem uma série de benefícios ao autista.

Apesar de tratar-se de uma síndrome ainda incurável, é importante ressaltar que a partir de um diagnóstico precoce é possível obter evoluções no comportamento, nas habilidades motoras, na interação interpessoal e na capacidade de comunicação da criança. É importante que as famílias possam estimular as crianças, superando os olhares diferentes e inserindo-as no meio social.

O tema sobre o autismo deve ser sempre colocado em pauta, pois é uma condição que a pessoa apresentará para toda sua vida. Uma criança autista, será um adulto autista, com todas as necessidades que são características da fase da vida que se possa apresentar. Assim sendo, reforça-se a importância de conhecer para garantir direitos e principalmente, o respeito para com eles.

Referências
Speltz, Silvana Farias; Vidal, Bruna; Sommerfeld-Ostetto Caroline Evelyn. Aspectos Psicológicos da Dinâmica Familiar de Crianças com Transtorno do Espectro Autista – TEA. ACE – Faculdade Guilherme Guimbala, Curso de Psicologia. Joinville, 2021
BELISÁRIO, J.; CUNHA, P. Transtornos Globais do Desenvolvimento. Coleção: A Educação Especial na Perspectiva da Inclusão Escolar. Ministério da Educação, Secretaria de Educação Especial, Universidade Federal do Ceará. Brasília, 2010.
BRASIL. Atenção psicossocial a crianças e adolescentes no SUS: tecendo redes para garantir direitos. Brasília: Ministério da Saúde. 2014.
CENTERS FOR DISEASE CONTROL AND PREVENTION. Data and Statistics on Autism Spectrum Disorder. Age last reviewed: September 25, 2020. Disponível em: https://www.cdc.gov/ncbddd/autism/data.html.
FERNANDES, A., MATSUKURA, S., LUSSI, O., FERIGATO, H., MORATO, G. Reflexões sobre a atenção psicossocial no campo da saúde mental infanto juvenil. Cadernos Brasileiros de Terapia Ocupacional, 28(2), 725-740. 2020. https://doi.org/10.4322/2526- 8910.ctoarf1870
MACHADO, G. D. S. A importância da rotina para crianças autistas na educação básica. Revista Gepes vida, 1(9), 100-114. 2019
Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais [recurso eletrônico]: DSM-5 / [American Psychiatric Association; tradução: Maria Inês Corrêa Nascimento … et al.]; revisão técnica: Aristides Volpato Cordioli… [et al.]. – 5. ed. – Dados eletrônicos. – Porto Alegre: Artmed, 2014.
MINISTÉRIO DA SAÚDE. Secretaria de Atenção à Saúde Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Diretrizes de Atenção à Reabilitação da Pessoa com Transtornos do Espectro do Autismo (TEA). 1ed, Brasília, 2014. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/diretrizes_atencao_reabilitacao_pessoa_autismo.pdf
SCHMIDT, C. Autismo, educação e transdisciplinaridade. In: SCHMIDT, C (org) Autismo, educação e transdisciplinaridade. Campinas, SP: Papirus, 2016.

Silvana Farias Speltz

Silvana Farias Speltz é Psicóloga, graduada em Joinville - SC, pela Faculdade Guilherme Guimbala. Formada também em Administração de Empresas, pela Universidade Positivo e em Pedagogia, pela Universidade Luterana do Brasil, especializando-se em Educação Especial, trabalhando por 15 anos em educação. Atualmente, é pós graduanda em TCC - Teoria Cognitivo-Comportamental. Na Psicologia, atende crianças, adolescentes e adultos, buscando identificar e tratar as questões que os pacientes apresentam e que refletem no comportamento, de modo a ressignificar situações e vivências, melhorando a sua qualidade de vida. CRP 08/36478 Contato: (42) 99115-2345

Existem 2 comentários

Deixe seu comentário para a noticia

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *